Como articular políticas públicas federais e iniciativas estaduais para fortalecer a inclusão produtiva rural no Brasil?

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Em entrevista, Gabriela Lotta detalha estudo realizado pela Cátedra Inclusão Produtiva Rural em parceria com o MDS, sobre a importância da coordenação entre diferentes níveis de governo para a implementação de políticas públicas

A inclusão produtiva rural no Brasil tem sido historicamente liderada pelo governo federal, responsável por financiar e induzir ações em todo o território nacional. Contudo, nas últimas duas décadas, a dinâmica entre estados e União sofreu transformações, especialmente no Nordeste, onde parcerias entre governos estaduais e organismos internacionais, como o FIDA e o Banco Mundial, fomentaram o desenvolvimento de capacidades locais e maior autonomia financeira. Nesse contexto, o estudo conduzido em parceria entre o Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS) e a Cátedra Itinerante Inclusão Produtiva Rural do CEBRAP Sustentabilidade busca responder à seguinte questão: como articular políticas públicas federais e iniciativas estaduais para fortalecer a inclusão produtiva rural no Brasil?

Conduzido por Mireya Valencia Perafán e Fabiano Jorge Soares, sob a supervisão de Gabriela Lotta e Arilson Favareto, o estudo explora experiências nos estados da Bahia, Ceará, Paraíba e Piauí, apontando desafios e oportunidades para ações integradas e complementares. Nesta entrevista, Gabriela Lotta, professora de Administração Pública e Governo da Fundação Getulio Vargas (FGV), apresenta os principais achados da pesquisa, reforçando a necessidade de coordenação entre diferentes níveis de governo, setores e atores para alcançar resultados mais efetivos. O estudo também traz recomendações práticas para fortalecer iniciativas na região Nordeste. Em breve a pesquisa completa será disponibilizada.

CIRP – O estudo desenvolvido pela Cátedra em parceria com o MDS sobre coordenação e complementaridade entre as políticas públicas federais e as iniciativas de governos estaduais do Nordeste brasileiro para a IPR, sistematiza uma série de aprendizagens importantes para favorecer a IPR. No entanto, confirma a hipótese da baixa coordenação entre os entes federativos para planejar e executar essas ações. Quais foram os possíveis caminhos identificados no estudo para reverter esse quadro?

GL – A coordenação federativa é sempre um grande desafio no Brasil, considerando o desenho da nossa lógica federativa que muitas vezes dificulta processos de coordenação e integração. Os avanços nesse sentido, em geral, podem acontecer por algumas medidas. Uma delas é pensar na lógica de sistemas de políticas, como aconteceu historicamente com o Sistema Único de Saúde (SUS) e o Sistema Único de Assistência Social (SUAS). Mas isso é restrito a algumas áreas. A segunda, é pensar a integração a partir da construção de mecanismos de regionalização e ação coordenada entre entes, como acontece no caso dos consórcios, por exemplo. Já a terceira, mais fácil, mas também menos permanente, é pensar na integração a partir de programas ou projetos compartilhados. E aí se cria uma cooperação e coordenação em torno de uma ação mais específica onde a integração fica mais fácil – mas mais instável e restrita também. E, nesta perspectiva, atuar com a lógica territorial é o que mais pode alavancar coordenação federativa – ou seja, todos os atores olhando para programas e projetos com foco em territórios específicos e que consigam gerar maior efetividade. Avançar nesses caminhos é muito importante para conseguirmos políticas mais efetivas e eficientes. Mas, para isso é necessário haver clareza de quais são os problemas territoriais a serem enfrentados, quais as soluções são possíveis de forma coordenada e ter vontade política para fazê-lo.

CIRP – ⁠Em outros estudos realizados por você, fica claro que existem desafios estruturais que devem ser vencidos para favorecer a integração entre setores de políticas públicas e entre entes federativos. A cultura setorial é um desses aspectos estruturais que, de igual forma, se evidencia no estudo realizado pela CIPR. Como seria possível enfrentá-la para propiciar sinergias que respondam aos problemas econômicos, sociais e ambientais que afetam as populações rurais?

GL – A administração pública é toda estruturada de forma setorial e separada entre entes federativos. Isso acontece com as estruturas administrativas, com a alocação de carreiras, com o orçamento etc.  E, além desses aspectos estruturais, há questões culturais que também dificultam a integração. As pessoas são formadas em cursos disciplinares, passam em concursos de carreiras setoriais, trabalham em setores etc. E tudo isso acaba gerando um olhar muito limitado e restrito para problemas complexos. Para avançarmos na integração setorial e federativa é preciso enfrentar estes obstáculos estruturais e culturais. Por exemplo, investir na construção de carreiras intersetoriais, transversais e estratégias; fazer formações mais intersetoriais; promover arranjos de coordenação que façam as burocracias se conversarem, conhecerem e colaborarem; criar espaços de socialização entre áreas e carreiras. Essas ações ajudam a mitigar os desafios da administração pública e geram maior capacidade de coordenação e integração.

 

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